Proposta de Estatuto Profissional do Técnico Superior de Educação Social

PREÂMBULO

O documento que apresentamos pretende responder a uma preocupação por parte dos educadores sociais portugueses: a criação de um Estatuto Profissional do Técnico Superior de Educação Social, verdadeiramente fundamentada, aprovada e reconhecida no nosso país, para ser aplicada em todos os contextos laborais sejam eles públicos ou privados. Sendo uma profissão mais ou menos recente, a Educação Social tem sentido algumas dificuldades de afirmação no terreno onde atua. Assim, a presente proposta surge para dar relevância à construção do saber e identidade profissional da Educação Social em Portugal em semelhança a outros países europeus.

Confiamos na Educação Social como uma construção de saberes, competências e práticas conducentes ao desenvolvimento psico-social-pedagógico dos cidadãos Portugueses. Uma construção de estatutos profissionais do Educador Social conduz a uma rentabilização das potencialidades formativas e profissionais, a uma redefinição de metodologias e competências, assim como ao auto-conhecimento da sua própria alteridade profissional perante outros técnicos implementados no terreno social há mais tempo, como por exemplo o serviço social.

Intitulado como “Estatuto Profissional dos Técnicos Superiores de Educação Social” ganha especial evidência ao ser equacionado no universo da Pedagogia Social, uma área científica que no nosso país só há dez anos, começou a dar os primeiros passos.

Ser Técnico Superior de Educação Social é questionar práticas e reflectir sobre o seu próprio papel interventivo, ser capaz de se aproximar do seu educando e de lhe conferir um destaque legítimo na construção do seu percurso de vida, valorizando as suas capacidades de aprender a ser, fazer e estar com os outros e valorizando as suas capacidades de aprender a aprender o seu repertório de experiências. Deste modo, optamos por uma metodologia fundamentada numa pesquisa bibliográfica, como recurso a livros, informação na Internet, consulta de experiências no âmbito da Educação Social vividas em outros países. Outras das fontes do nosso levantamento a que recorremos, basearam-se na recolha de testemunhos de experiências pessoais de Técnicos Superiores de Educação Social que se encontram no terreno e fora dele e ao trabalho desenvolvido por instituições legais que representam a Educação Social em Portugal, sendo elas Universidades, Escolas e Institutos Superiores, Associação Portuguesa de Educação Social e o Grupo de Trabalho de Educadores Sociais Portugueses, fundado em 2001, inserido no Sindicato dos Trabalhadores da Saúde, Solidariedade e Segurança Social.

A educação social surgiu, em Portugal, na década de 70 para 80, primariamente como um curso técnico-profissional que concebia a equiparação ao 12.º ano de escolaridade. Na década de 80 para 90, proliferaram os cursos de educação social, a título de bacharel, com a duração de três anos, leccionados nas Escolas Superiores de Educação. Ao longo do tempo, desenvolveu-se a necessidade e fortificou-se a importância desta metodologia de intervenção a nível das ciências sociais e da educação. Em 1996, foi homologada a primeira licenciatura em Educação Social, desenvolvida pela Universidade Portucalense Infante D. Henrique. A partir desse momento, as escolas superiores públicas e os institutos privados começaram a criar licenciaturas e licenciaturas bietápicas que têm vindo a aumentar.

Inicialmente, a educação social, técnico-profissional e bacharel, tinha como finalidade desenvolver actividades recreativas para diferentes tipos de população, abrangendo crianças, adultos e idosos. Era uma metodologia centrada na animação social e cultural. Com o aparecimento do bacharelato, foram aprofundados alguns dos conhecimentos teórico-práticos que permitiram a este profissional prestar ajuda técnica a outros profissionais da área das ciências sociais e da educação. A importância deste grupo profissional foi crescendo ao  longo do tempo e, cada vez mais, nos dias de hoje se fala do papel fulcral do Educador Social.

Actualmente, vivemos um período de confronto e confusão entre membros do mesmo grupo profissional, devido às diferentes categorias profissionais e académicas. O curso evoluiu devido à necessidade e, por isso, apresentamos a proposta que se segue para aprovação do Estatuto dos Técnicos Superiores de Educação Social.

 

CAPÍTULO I

Objecto, âmbito, natureza e estrutura da carreira

Artigo 1.º | Objecto

  1. O presente diploma estabelece o estatuto legal da carreira dos Técnicos Superiores de Educação Social, integrada no âmbito das carreiras técnicas superiores da administração pública.

 

Artigo 2.º | Âmbito

O presente diploma aplica-se, no território nacional, a todos os educadores sociais nomeados em lugar quadro de pessoal dos estabelecimentos e serviços públicos da administração central, regional e local e ainda empresas e institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos por eles tutelados em cujos quadros de pessoal se encontre ou venha a ser prevista a carreira, incluindo os que se encontrem em regime de instalação.

 

Artigo 3.º | Natureza e objectivos

  1. A carreira dos Técnicos Superiores de Educação Social enquadra todos os licenciados em educação social pelos organismos de ensino superior nacionais ou estrangeiros oficialmente reconhecidos e que exerçam a sua actividade no  território nacional, qualquer que seja o regime em que desenvolvem a sua actividade.
  2. No desenvolvimento das suas funções, os educadores sociais licenciados atuam em conformidade com o processo de investigação e intervenção social, cabendo-lhe conceber, planear, organizar, aplicar e avaliar o processo profissional no âmbito da respectiva profissão, com o objectivo de promover o desenvolvimento psicossocial e bem-estar social de sujeitos, grupos e comunidades nos diversos âmbitos sócio -educativos.

 

Artigo 4.º | Estrutura da carreira

  1. De acordo com o Decreto-lei no 248/85, de 15 de Julho, as carreiras da administração pública podem integrar-se em grupos de pessoal definidos com base na caracterização genérica do respectivo conteúdo funcional e nas exigências habilitacionais e profissionais (n.º 1 do artigo 7.º) caracterização genérica essa que consta do mapa I anexo ao citado Decreto-Lei, com distinção por grupos de pessoal. No presente caso são: Grupo de pessoal técnico superior, a que correspondem funções de concepção, para que é exigida habilitação com licenciatura; Grupo de pessoal técnico, a que correspondem funções de aplicação, sendo exigida habilitação com curso superior.
  2. A profissão de Técnico Superior de Educação Social tem enquadramentos diferentes devido à evolução do próprio curso, nos grupos de pessoal técnico superior, técnico ou técnico-profissional, consoante a habilitação académica ou profissional obtida em cada caso, necessitando por isso de uma rectificação no enquadramento da profissão, no que concerne à carreira de técnicos superiores.
  3. A carreira dos Técnicos Superiores de Educação Social desenvolve-se pelas categorias de Técnicos Superiores de Educação Social de 3.ª classe, de Técnicos Superiores de Educação Social de 2.ª classe, Técnicos Superiores de Educação Social de 1.ª classe, Técnico Superior de Educação Social principal, Técnico Superior de Educação Social assessor e Técnico Superior de Educação Social assessor principal, às quais correspondem funções da mesma natureza, complexidade e responsabilidade, atendendo à actual dotação dos quadros da função pública.

 

CAPÍTULO II

Conteúdo Funcional

Artigo 5.º | Conceito

  1. A educação social consubstancia-se numa metodologia de intervenção sócio-pedagógica das ciências sociais e da educação que investiga e intervém ao nível das relações dos atores sociais que representam a organização e dinâmica social das sociedades e comunidades locais. Os Técnicos Superiores de Educação Social baseiam a sua intervenção no desenvolvimento social, cultural e pedagógico dos indivíduos e das famílias.
  2. O desempenho profissional dos Técnicos Superiores de Educação Social garante o papel de ajudar a manter vivo e saudável o espaço de relacionamento e desenvolvimento interpessoal entre o indivíduo, o seu espaço individual e o seu contexto sócio -cultural.
  3. A educação social baseia-se no princípio da igualdade, onde todas as pessoas possuem direitos, oportunidades, capacidade, compromisso e responsabilidade no desenvolvimento da sua realização, valorização pessoal, social e profissional. Classificam-se como agentes, mediadores de processos de desenvolvimento e transformação comportamental de âmbito psicossocial.
  4. Os Técnicos Superiores de Educação Social concebem, organizam e prestam apoio de âmbito psicossocial, cultural e pedagógico a indivíduos, grupos e famílias inseridos em contextos sociais diversificados. Acompanham todo o processo de socialização dos sujeitos e famílias.
  5. Os Técnicos Superiores de Educação Social pela sua habilitação académica, científica e técnica, encontram-se aptos para intervir de forma autónoma ou em equipas multidisciplinares, no âmbito da concepção, investigação, desenvolvimento e avaliação de programas, projectos e actividades de cariz sócio- pedagógico, que assentem na valorização de uma multiplicidade de espaços de educação, prevenção, mudança e resolução de problemas e necessidades.
  6. São procedimentos dos Técnicos Superiores de Educação Social, a interdisciplinaridade e o trabalho em equipa que são assumidos como fundamentais no trabalho em rede com parceiros sociais.
  7. A educação social refere-se a todas as formas de prática educativa e pedagógica desenvolvida em contexto social e no âmbito de estratégias de educação não formal, fomentando uma cultura de aprendizagem permanente, que implica coordenar, executar, articular, potenciar, apoiar, gerir, avaliar projectos e programas numa lógica territorial assente em redes, atores e parcerias sociais.
  8. A actividade profissional dos Técnicos Superiores de Educação Social situa-se a nível local, regional e central na estrutura dos diferentes sistemas sectoriais e participam na criação, coordenação, definição, cumprimento, apreciação e avaliação de medidas político-sociais.

 

Artigo 6.º | Finalidades

Os Técnicos Superiores de Educação Social dirigem o seu conteúdo funcional para as seguintes finalidades:

  1. O Técnico Superior de Educação Social é um profissional com formação superior, que atua formativamente perante indivíduos, grupos ou comunidades numa perspectiva de prevenção e reabilitação de problemas sociais, culturais e com vista a uma inserção social e profissional plena do indivíduo.
  2. No exercício das suas funções promove, dinamiza, apoia e concretiza actividades de carácter educativo, sócio-pedagógico, social, formativo e cultural a indivíduos, grupos, famílias e comunidades, no sentido de melhorar as condições de vida dos seus destinatários.
  1. Integram serviços, equipas e unidades ligadas à promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento, acompanhamento, aconselhamento, educação e reabilitação de sujeitos em desvantagem social.
  1. Acompanha psicossocialmente indivíduos, famílias, grupos e comunidades, coadjuvando-as no desenvolvimento das suas potencialidades e competências pessoais, sociais, fomentando a responsabilidade e a mudança de comportamentos dos sujeitos.
  1. Promove a aquisição de regras horárias e rotinas, trabalho de competências ao nível da resolução de conflitos e dificuldades. Potencia os recursos relacionais das pessoais e famílias, potenciando a auto-estima e diversificando fontes de motivação nas pessoas com as quais trabalha.
  2. Organiza e coordena actividades com carácter lúdico-pedagógicas como animação sócio-cultural, sessões educativas, dinâmicas de grupo e actividades de tempos livres, contribuindo para melhorar o bem-estar de diversos grupos sociais.
  3. Promove e desenvolve competências pessoais, familiares, sociais e profissionais de integração social do indivíduo, valorizando a sua participação no grupo, na família e na comunidade.
  1. Fomenta o desenvolvimento de políticas educativas, culturais, sociais e profissionais, realçando o trabalho em rede e envolvendo os diversos parceiros sociais.

 

Artigo 7.º | Funções

  1. Para os efeitos do artigo anterior, e em conformidade com os pontos mencionados anteriormente no que se refere ao conceito, teoria, metodologia e conteúdo funcional dos técnicos superiores de educação social, desenvolvem conjuntamente as seguintes funções:
    1. Trata de forma sócio-terapêutica e pedagógica, pessoas frágeis, em desvantagem social e ou excluídas da vida social, tentando criar um bem- estar psicossocial no indivíduo.
    2. Promove e desenvolve competências de integração social e profissional do indivíduo valorizando a sua participação no grupo, na família e na comunidade.
    3. Efectua investigação, analisa e avalia meios sociais, problemas de foro psicológico, social e cultural, através do levantamento das necessidades e carências sentidas, de forma a criar programas e encaminhamentos no sentido da resolução dessas mesmas problemáticas.
    4. Elabora, desenvolve e coordena projectos de intervenção, programas educacionais, de cariz social, tal como, prevenção primária, secundária e terciária, destinada a população de risco.
    5. Trabalha em equipas integradas visando a articulação de saberes multi e transdisciplinares.
    6. Proporciona ao grupo alvo a aquisição de conhecimentos multiculturais, desenvolvendo atitudes, competências e valores relativos ao respeito pela diversidade cultural da sociedade.

 

CAPÍTULO III

Inserção institucional

Artigo 8.º | Contextos Institucionais

  1. Ministério da Administração Interna
  2. Ministério da Educação
  3. Ministério da Justiça
  4. Ministério da Saúde
  5. Ministério do Trabalho e Solidariedade Social
  6. Autarquias
  7. Gabinetes de intervenção pública, local, regional, central

 

Artigo 9.º | Contextos Pluridisciplinares

  1. Os Técnicos Superiores de Educação Social integram-se funcionalmente com outros profissionais das mais diversas áreas; saúde, social, educacional e cultural.

 

CAPÍTULO IV

Organização

Artigo 10.º | Gabinetes de Educação Social

  1. Os Técnicos Superiores de Educação Social, em todos os contextos institucionais (Locais, Regionais e Centrais), constituem e organizam-se em Departamentos de Educação Social, não obstante de ficarem directamente dependentes do Director máximo da instituição.
  2. O Departamento de Educação Social é dirigido por um Técnico Superior de Educação Social, para todos os efeitos equiparado a director de serviços desse departamento.
  3. O director é eleito mediante aprovação de todos os membros pertencentes à direcção e por regulamentação específica.
  4. Ao Técnico Superior de Educação Social compete gerir as actividades inerentes ao departamento que dirige, assegurando o seu bom funcionamento, qualidade dos serviços prestados, sem prejuízos para os beneficiários do serviço e técnicos.

 

CAPÍTULO V

Quadros de Pessoal

Artigo 11.º | A estruturação de quadros de pessoal

  1. A estruturação de quadros de pessoal dependerá de Portarias Ministeriais específicas, definidoras dos critérios orientadores da determinação de rácios e de acordo com as necessidades de cada sector.

CAPÍTULO VI

Recrutamento e Selecção de Pessoal

Artigo 12.º | Critérios de selecção

  1. Os critérios de selecção de pessoal em concursos de ingresso e de progressão na carreira dos Técnicos Superiores de Educação Social, sem prejuízo da legislação geral em vigor, serão objecto de regulamentação específica.

 

Pelo Grupo de Trabalho Nacional dos Técnicos Superiores de Educação Social, 2007